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sábado, 31 de dezembro de 2011

Recordes desastrosos

Desastres ambientais sem precedentes, números alarmantes associados ao aquecimento global e polêmicas sobre questões políticas foram os destaques da área de meio ambiente em 2011.

O ano de 2011 foi marcado pela ocorrência de grandes desastres ambientais em todo o planeta e por números alarmantes associados ao aquecimento global. Na esteira desses recordes negativos, intensificaram-se as discussões – e as polêmicas – sobre ações e políticas governamentais relacionadas com o meio ambiente.

Para os brasileiros, o ano começou com a pior tragédia ambiental já vivida no país: as enchentes e os deslizamentos de terra provocados pelas chuvas na região serrana do Rio de Janeiro. Ainda em janeiro, dezenas de cidades de Minas Gerais e Santa Catarina decretaram situação de emergência por causa das fortes chuvas.

Fora do Brasil os estragos não foram menores. Austrália e Tailândia viveram as piores enchentes dos últimos 50 anos. Mas nenhuma tempestade foi tão devastadora este ano quanto a que atingiu as Filipinas em dezembro.

Se a água foi o maior problema para alguns países, para outros a falta dela foi a grande vilã. O nordeste da África – região conhecida como Chifre de África, que inclui Somália, Etiópia, Djibouti e Eriteia – passou pela pior seca dos últimos 60 anos e ainda sente os efeitos da escassez de comida provocada pelo fenômeno.

Na China, a seca que começou em 2010 não deu trégua em 2011 e também se tornou a pior dos últimos 60 anos. Especialistas alertam que a queda na produção agropecuária chinesa pode levar a uma crise alimentar global. Não bastasse a falta de água, várias províncias da China ainda enfrentaram chuvas torrenciais. Os Estados Unidos sofreram um número recorde de eventos climáticos extremos este ano. O principal deles foi a seca no Texas, a pior já ocorrida no estado.

Terremotos atingiram países como Sibéria, Nova Zelândia e Turquia. Mas nada se comparou ao terremoto seguido de tsunami que atingiu o Japão em março e provocou explosões na usina nuclear de Fukushima, resultando em um dos maiores acidentes nucleares da história.

Além dos efeitos ambientais, a tragédia japonesa colocou em evidência as discussões sobre o uso da energia nuclear e muitos países europeus já decidiram abandonar essa fonte. A Alemanha, por exemplo, anunciou que vai antecipar o fechamento de suas usinas nucleares para 2022 e a Suíça também decidiu acabar com seus reatores.

Culpa do aquecimento global
Diversos estudos têm relacionado a maior frequência ou o agravamento de eventos naturais extremos ao aquecimento global. “Este foi o 11º ano mais quente desde o início dos registros”, ressalta o biólogo Jean Remy Guimarães, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro e titular da coluna ‘Terra em transe’ da CH On-line.

Pesquisas realizadas no Canadá e no Reino Unido mostraram que a presença de gases-estufa derivados da ação humana contribui para elevar a temperatura da atmosfera e leva a um acúmulo maior de vapor d’água, o que aumenta significativamente a probabilidade de tempestades.

Além disso, um relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) concluiu que há uma probabilidade de 66% de que as alterações no clima já estejam contribuindo para agravar a ocorrência de eventos climáticos extremos. E a situação deve piorar se o planeta continuar a aquecer.

Por falar em aquecimento, mapas de satélites mostraram que o gelo do Ártico está derretendo em nível nunca registrado desde que as observações começaram, em 1972. Se essa tendência permanecer, os pesquisadores acreditam que não haverá gelo na região polar nos meses de verão dentro de 30 anos – cerca de 40 anos antes do que previa o último relatório do IPCC.

A julgar pelas emissões de gás carbônico, o prognóstico não é nada animador. Um estudo norueguês publicado na recém-lançada Nature Climate Change concluiu que, em 2010, as emissões de CO2 cresceram 5,9% em relação ao ano anterior e bateram seu recorde histórico.

Por outro lado, um relatório especial do IPCC lançado em maio destaca o potencial das fontes alternativas de energia para manter as emissões de gases-estufa abaixo do limite considerado seguro pelos cientistas e mitigar as mudanças climáticas. De acordo com o documento, se forem usadas todas as tecnologias renováveis disponíveis atualmente, com apenas 2,5% das fontes alternativas viáveis seria possível suprir cerca de 80% da demanda mundial de energia até 2050.

Segundo estudos da Associação Mundial de Energia Eólica, até o primeiro semestre de 2011, 86 países já usavam essa fonte renovável na geração de energia elétrica, entre eles, a China, detentora da maior capacidade instalada. O Brasil parece estar seguindo essa tendência de crescimento, com o anúncio da implantação de vários parques eólicos. Atualmente, a energia dos ventos é responsável por 1% da matriz energética nacional – mas a estimativa do potencial eólico brasileiro é bem maior do que a capacidade de geração instalada.

O Programa de Meio Ambiente das Nações Unidas anunciou este ano que os investimentos em energia renovável cresceram 32% em 2010. Na contramão da história, a indústria de energia renovável dos Estados Unidos tem seu futuro ameaçado pelo fim iminente da ajuda governamental que a fez prosperar nos últimos anos.


Entre perdas e ganhos
No campo político, os olhos do mundo voltaram-se para a COP-17, realizada em Durban, na África do Sul. A conferência foi considerada um sucesso diplomático e o Brasil teve papel importante nesse desfecho. O saldo foi a renovação do Protocolo de Kyoto, a consolidação do Fundo Verde do Clima (que será usado para combater as emissões e promover ações de adaptação à mudança climática nos países em desenvolvimento) e a construção das bases de um futuro acordo que prevê limites compulsórios de emissões, inclusive para Estados Unidos, China, Índia e Brasil.

Apesar desse ‘avanço’, a preocupação com o meio ambiente ficou em segundo plano, já que o acordo só será realmente fechado em 2015 e passará a vigorar em 2020. “Não dá para garantir que os governos vão honrar seus compromissos, pois as autoridades serão outras no futuro”, ressalta Jean Remy Guimarães. “A COP-17 foi a continuação do retrocesso observado nos anos anteriores.”

No plano interno, o Brasil tem adotado uma postura bem diferente. Em meio a liminares concedidas e revogadas, o projeto de construção da hidrelétrica de Belo Monte (Pará) segue seu curso, apesar da oposição local cada vez mais forte. “Dezenas de associações estão se organizando em uma campanha contra o projeto”, diz Guimarães.


As obras para a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, já foram iniciadas, apesar da forte oposição de diversos setores da sociedade e grupos locais. (foto: Programa de Aceleração do Crescimento-PAC/ CC BY-NC-SA 2.0)
O debate público sobre os impactos ambientais da usina ganhou maior destaque após uma batalha de vídeos divulgados na internet que mobilizou as redes sociais: um contrário ao projeto produzido por atores da Rede Globo e dois em defesa da hidrelétrica, feitos por estudantes da Universidade Estadual de Campinas e da Universidade de Brasília. Ao que tudo indica, a polêmica deve continuar.

As discussões sobre os riscos ambientais associados a atividades de exploração de recursos naturais e a forma como o governo lida com essas questões também vieram à tona com o vazamento de petróleo em poços da empresa Chevron em Campos (Rio de Janeiro) e a possibilidade de diminuição da área de proteção da Serra da Canastra, em Minas Gerais, para a extração de diamantes – debate que deve ser retomado em 2012.

Para não dizer que 2011 – declarado pela ONU o Ano Internacional das Florestas – teve apenas recordes negativos, em dezembro o governo brasileiro divulgou que a taxa de desmatamento na Amazônia entre julho de 2010 e julho de 2011 foi a menor já registrada desde que começaram as medições, em 1988: 6.238 km2, valor 11% menor que o do ano anterior.

Para Guimarães, não há muito que comemorar, pois essa queda estaria relacionada ao fato de a cobertura florestal ser menor hoje. “Além disso, em alguns estados, como Maranhão e Rondônia, as taxas de desmatamento são escandalosas”, destaca.

Na mata atlântica, os números apontam queda de 50% no desmatamento entre os períodos de 2005 a 2008 e 2008 a 2010. Mesmo assim, a situação do bioma, que tem apenas 8% de sua cobertura original, preocupa.

Resta saber se essas taxas continuarão caindo caso o novo Código Florestal Brasileiro seja aprovado e sancionado em 2012, mesmo diante das polêmicas que gerou este ano. Mas essa é uma longa história, que será relembrada no próximo capítulo desta retrospectiva.

Thaís Fernandes
Ciência Hoje On-line

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