De 20 a 22 de Junho de 2012, a cidade do Rio de Janeiro vai sediar a conferência da ONU sobre Desenvolvimento Sustentável, chamada de Rio + 20, em alusão à Cúpula da Terra ocorrida há 20 anos na mesma cidade. A Eco 92 foi um evento histórico e paradigmático ao abordar problemas globais que começavam a se tornar evidentes, produzindo documentos multilaterais de suma importância como a Convenção sobre Mudanças do Clima (UNFCCC), a Convenção sobre Biodiversidade (CBD), a Declaração do Rio e a Agenda 21. A Rio+20 terá como foco de discussão a economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e a erradicação da pobreza. Em que pese a relevância de seu mandato, é pouco provável que a Rio+20 reproduza o consenso que se obteve na Eco92 eis que o contexto político e econômico em 2012 é muito diferente daquele existente em 1992. As múltiplas estruturas de poder existentes no sistema da ONU, os interesses divergentes e as disparidade no estágio de desenvolvimento em que encontram os países membros da Organização tornam a cooperação multilateral morosa e complexa. Inobstante tais desafios, nenhum outro foro é capaz de mobilizar a comunidade international, compartilhar conhecimento científico, ou estabelecer princípios e diretrizes internacionais que serão, posteriormente, aplicados em âmbito local.
É justamente em âmbito local que se aplicam a maior parte das medidas necessárias ao enfrentamento da crise planetária que vivemos. É na cidade que o indivíduo vive, trabalha, tem seu lazer e se relaciona com os demais indivíduos e instituições. Metade da população mundial vive em aglomerados urbanos, consumindo 2/3 da energia produzida e respondendo por mais de 70% das emissões globais dos gases de efeito estufa. Por atribuição constitucional, às cidades cabem ações locais nas áreas de mobilidade urbana, saneamento, resíduos sólidos, uso e ocupação do solo e dos espaços construídos, as quais por sua vez, estão intimamente relacionadas às políticas de mitigação e adaptação às mudanças climáticas. Neste contexto, as cidades exercem papel fundamental na articulação, no gerenciamento e no cumprimento das políticas ambientais. A solução para a questão da mobilidade urbana passa por tornar o transporte coletivo de passageiro mais cada vez mais ágil e confortável, aumentando sua participação na matriz modal. O resultado é a melhora da mobilidade e a redução das emissões de poluentes, com efeitos na qualidade do ar local e nas emissões dos gases de efeito estufa. Parte integrante desta política de mobilidade é a adoção de medidas que tornem o transporte motorizado individual uma experiência cara, difícil ou maçante, induzindo a população à utilização de meios de transporte coletivos ou não motorizados. Na área de saneamento os dados são alarmantes pois, no Brasil, apenas 53% do esgoto coletado é tratado, segundo dados de 2008 lançados no sítio no Ministério das Cidades e o seu lançamento nos corpos hídricos é a razão da qualidade ruim ou péssima da água na maioria dos rios, lagoas e reservatórios próximos a regiões metropolitanas. Fazem parte de uma política de saneamento o fornecimento de água potável em quantidade e qualidade, a drenagem pluvial urbana, a coleta, tratamento e destinação sanitária, bem como, o manejo dos resíduos sólidos. Com o objetivo de suprir as lacunas existentes, o governo Federal trabalha na elaboração do Plano Nacional de Saneamento Básico e do Plano Nacional de Resíduos Sólidos, que fornecerão as diretrizes para a elaboração dos planos estaduais e, finalmente, municipais. No tocante ao uso e ocupação do solo e dos espaços construídos, o conceito de cidades compactas é um conceito de planejamento urbano que busca estimular uma maior densidade por m2, por meio da verticalização, da recuperação de espaços urbanos subutilizados e da criação de espaços multiuso, com áreas verdes, zonas comerciais e residenciais misturadas. É recomendável que este conceito seja acompanhado por políticas que promovam maior eficiência energética nas novas construções, readequação dos espaços construídos através de programas de retrofit, além do aproveitamento do calor residual industrial.
Para discutir o papel das cidades no enfrentamento das mudanças climáticas, São Paulo sediou, no primeiro semestre deste ano, a conferência de prefeitos da rede de cooperação internacional C40 de Grandes Cidades, e Porto Alegre foi palco do 10º Congresso Mundial da rede Metropolis, ocorrido nos dias 23 a 26 de Novembro. Na mesma semana, nossa cidade recebeu o IV Congresso Brasileiro de Municipalismo que, neste ano, teve por tema o Programa Cidades Sustentáveis. Não restam dúvidas de que a solução dos atuais desafios ambientais requer estreita cooperação internacional, a qual será testada no Rio de Janeiro no próximo ano. Contudo, com fundamento no Estatuto das Cidades e apoio das redes de cooperação nacional e internacional, os municípios já dispõem de ferramental para a elaboração de uma agenda para a sustentabilidade, que deve contemplar políticas públicas ambientalmente responsáveis, socialmente justas e economicamente inclusivas. Se estivermos, de fato, vivendo uma nova era geológica, a Antropocena, como anunciado pelo prêmio Nobel de química, Paul J. Crutzen, então a sociedade tem o grande poder de moldar o ambiente que queremos para nós e nossos descendentes. A solução é tão complexa quanto o problema e requer a participação e cooperação não apenas dos governos, mas também dos cidadãos, organizações sociais e empresas. Somos todos parte do problema e da solução e nunca o aforismo, “pense globalmente, mas atue localmente” foi tão apropriado.
* Advogada, LLM em Direito Ambiental.
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