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segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Superbactéria se alastra e chega à metade dos Estados do Brasil

A bactéria KPC (Klebsiella pneumoniae carbapenemases), também chamada de superbactéria, por ser resistente a quase todos os antibióticos disponíveis, já chegou aos hospitais de 13 Estados brasileiros, segundo levantamento realizado pelo R7 nas 23 Secretarias Estaduais de Saúde do país. Maranhão, Amapá e Tocantins, que não haviam registrado nenhum caso até o último levantamento oficial realizado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), em outubro, surgem no mapa da KPC no país, todos com mortes atribuídas à doença.

Ainda pelo levantamento, foi constatado um grande aumento no número de casos e óbitos no Distrito Federal, com 319 infectados e 25 mortes, ante os 207 casos e 22 mortes em outubro. No Rio de Janeiro, 83 pessoas foram infectadas e 13 morreram por causa da superbactéria, muito acima dos 43 casos e três mortes informadas também em outubro.

A incidência da KPC aumentou também no Nordeste. Dos 150 casos suspeitos no Ceará até outubro, 23 foram confirmados pela Secretaria de saúde do Estado no início de dezembro. Trinta e cinco pessoas foram infectadas e cinco morreram em Pernambuco até novembro, dado parecido com o da Paraíba, onde 34 pessoas foram infectadas, 15 só na primeira semana de dezembro. Os dados são da Ceciss (Comissão Estadual de Controle de Infecção em Serviços de Saúde), da secretaria estadual de Saúde. Todos os casos vêm de hospitais da capital João Pessoa.

No Maranhão foi registrado um caso confirmado, que levou o paciente à morte.

Mas é no Paraná que a bactéria se alastra com velocidade, se os dados considerados informais realmente valerem. De acordo com a secretaria estadual de saúde do Estado, cerca de 300 casos foram notificados desde o início do ano. No entanto, frisam ser uma estimativa “porque ainda não saiu a portaria da obrigatoriedade dos casos. Então, esses números ainda são informais”.

Toda essa “informalidade” na informação de dados sobre a KPC mostra que atualmente não é possível chegar a um número oficial de casos no Brasil. Isso acontece porque nem todos os Estados brasileiros são obrigados a repassar estes dados as esferas estaduais, apenas em casos de surto, após a Anvisa ter deixado de repassá-los por meio das secretarias municipais e estaduais de saúde, em outubro.

Questionada se essa lacuna, que permite aos Estados não informarem dados ou repassá-los como não oficiais, cria chances de se omitir surtos e o número de casos e mortes pela doença, a agência não respondeu.

Por meio da assessoria, explicou o motivo da mudança. “Foi pactuado junto com as vigilâncias sanitárias municipais e estaduais que elas seriam as responsáveis por passar os últimos casos registrados em cada Estado, já que o processo acaba fazendo com que os números da Anvisa fiquem desatualizados.”

A Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo se baseia nessa falta de regulamentação para não divulgar a incidência da KPC no Estado. Afirma que, por não haver surtos, não são obrigados a divulgar casos espaçados.

De acordo com o último levantamento da Anvisa, havia no Estado pelo menos 70 casos que decorreram em 24 mortes, de julho de 2009 a outubro de 2010.

Fora São Paulo, Minas Gerais lidera em número de casos da superbactéria na região Sudeste. Segundo a Secretaria Estadual de Saúde do Estado, 51 casos foram notificados em Minas Gerais, 49 em Belo Horizonte e dois em Nova Lima, de dezembro de 2009 a setembro de 2010.

No Espírito Santo foi comprovada a infecção de seis pessoas entre abril e outubro desse ano e três óbitos, sem confirmação se foram pela bactéria KPC.

Apesar de casos espaçados, a bactéria já chegou aos hospitais da região Norte, onde infectou uma pessoa no Amapá e outra no Tocantins, levando-as à morte.

Como pega e previne – O nome KPC na realidade é de uma enzima produzida por um grupo de bactérias, das quais a principal é a klebisiela, que tem o poder de destruir grande número de antibióticos. O nome “superbactéria” foi atribuído a ela pelo fato de ser proveniente de uma bactéria que desenvolve mais resistência aos antibióticos e tem grande facilidade de se transmitir no ambiente hospitalar e causar surtos de infecção hospitalar, explica Carlos Magno Fortaleza, professor de infectologia da Faculdade de Medicina da Unesp (Universidade Estadual Paulista).

“A klebisela é uma bactéria que faz parte do nosso intestino, mas as bactérias com frequência adquirem um pedaço de material genético que passam de uma bactéria para outra. Uma certa linhagem da klebisela adquiriu um pedaço de DNA que produzia essa enzima. Além de se reproduzir, essa bactéria, que carrega esse DNA, acabou fornecendo para outras espécies.”

O que causa a infecção, explica o professor, é quando a bactéria alojada no intestino chega a outras partes do corpo, pode infeccioná-las, causando doenças. Por exemplo, se chega ao pulmão causa pneumonia e a pessoa pode morrer.

“As infecções hospitalares acontecem quando algum procedimento médico faz com que bactérias que estejam muito quietas invadam outros lugares onde não deveriam estar. Seja porque a pessoa fez uma cirurgia, ou precisou de um aparelho para respirar, de alguma maneira se quebra a ecologia daquele organismo e a bactéria sai de onde ela estava sem provocar nenhuma doença e acaba atingindo um lugar onde ela provoca uma doença.”

Essa lógica que serve causa uma série de infecções bacterianas, é a mesma da kpc, explica Fortaleza. “A diferença da kpc para outras klebisielas é q ela é mais resistente a antibióticos, não porque ela mata mais.”

Vale lembrar que a infecção por KPC geralmente ocorre em pessoas já com a saúde debilitada. Isso acontece, segundo o professor, porque elas passam mais por processos invasivos, seja cirurgia, uso de sondas ou aparelhos, que ajudam a bactéria a “correr pelo corpo”, afetando órgãos mais sensíveis. Ao mesmo tempo, tomam mais antibióticos por estar em algum tratamento, já que estão hospitalizadas.

Tratamento – A kpc já é identificada no mundo desde 2001, quando apareceu nos Estados Unidos, segundo a Anvisa. O que chamou a atenção nesse ultimo ano foi que ela passou a surgir com uma grande frequência em alguns locais do Brasil, principalmente no Distrito Federal e em alguns hospitais de são Paulo.

Como prevenção, os hospitais tiveram de isolar os pacientes e aumentar o rigor da higiene dos profissionais, com uso reforçado de soluções de álcool em gel antes e depois de mexer em pacientes, além dos já recomendados usos de luvas e aventais, explica o infectologista Luis Fernando Aranha Camargo, do Hospital Albert Einstein, em São Paulo.

Em outubro foram notificados três casos em pacientes do hospital. Todos foram isolados para conter a proliferação, conta Camargo.

Dado o diagnóstico, o tratamento ocorre de acordo com a gravidade da infecção, afirma Camargo. “Se o paciente tiver somente a bactéria colonizada você não faz nada. Mas se ele tem a doença, você tratará de acordo com a manifestação clínica dela. Hoje poucos antibióticos são eficientes.”

As polimixinas são exemplos, mas por serem muito tóxicas, estão abrindo caminho para outros antibióticos apesar de serem muito tóxicos. “A gente faz o máximo possível para não usar as polimixinas, mas a maioria usa. O uso por pelo menos dez dias pode causar insuficiência renal, escurecimento da pele e em alguns casos modificar quadros neurológicos.”

O medicamento é usado por pelo menos uma semana em casos mais leves e até um mês em casos graves. A média de desenvolvimento de uma insuficiência renal pode chegar de 30% a 40%, explica Camargo.

(Fonte: Portal R7)

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