quarta-feira, 24 de julho de 2013
Vírus recém-descobertos podem redefinir a vida como a conhecemos
Cientistas descobriram dois vírus que desafiam a classificação da vida. Maior e geneticamente mais complexos do que qualquer gênero viral conhecido pela ciência, os chamados “pandoravírus” podem reacender um debate de longa data sobre a classificação do que é considerado vida. Esse nome foi dado devido às surpresas que os seres podem ter reservado aos biólogos, em referência à figura mítica grega que abriu uma caixa e liberou o mal no mundo. Houve um tempo em que os cientistas consideravam os vírus seres muito pequenos e simples. Até que sugiu o “mimivírus”, descoberto em 1992. À época, se tratava, de longe, do maior e mais complexo vírus já encontrado pelos cientistas.
Com 600 nanômetros de diâmetro (dimensão comparável em tamanho a algumas bactérias) e com um genoma de cerca de mil genes, o mimivírus em muitos aspectos possuía maior semelhança com uma bactéria parasita do que com um vírus. Em comparação, o HIV mede apenas 120 nanômetros de diâmetro e contém um total de apenas nove genes. O nome “mimivírus” vem da abreviatura em inglês de “vírus imitando (mimicking) micróbio”.
Uma vasta lista de outros vírus de grande porte têm sido descobertos desde então – o mamavírus, por exemplo, e o apropriadamente chamado megavírus. Nesta quinta-feira (18), no entanto, pesquisadores da Universidade de Aix-Marselha, liderados pelos biólogos Jean-Michel Claverie e Chantal Abergel (que ajudou a revelar o mimivírus) anunciaram uma descoberta ainda mais surpreendente.
Trata-se do pandoravírus, recolhido na lama de águas costeiras de Melbourne, na Austrália, e da região central do Chile, que é duas vezes maior do que qualquer outro vírus conhecido pela ciência. Cada um deles possui cerca de 2.500 genes, 2.300 dos quais inteiramente novos para a biologia. Pandoravírus, em outras palavras, não são apenas enormes, também são inconfundivelmente diferentes de qualquer vírus conhecido na terra – incluindo outros vírus gigantes.
O fato de esses pandoravírus serem tão geneticamente únicos (sem contar que eles foram coletados em continentes completamente diferentes) sugere que os gêneros virais gigantes podem ser mais comuns do que se acreditava anteriormente. Além disso, os vírus recém-descobertos ainda levantam questões interessantes sobre as fronteiras entre as células vivas e os vírus inanimados.
A equipe também realizou vários experimentos para confirmar se os pandoravírus eram realmente vírus. Usando microscópios de luz e eletrônicos, os cientistas acompanharam um ciclo de replicação completa dos seres recém-descobertos. Eles identificaram, com isso, os três critérios fundamentais para classificá-los como vírus.
Eis uma brincadeira divertida para se jogar na próxima vez que você encontrar seus primos biólogos. Primeiro, aguarde uma pausa na conversa. Em seguida, mexa-se despretensiosamente em sua cadeira e casualmente pergunte se os vírus são seres vivos. Muito bem! Você acaba de alimentar as chamas do debate que os profissionais da área têm travado por cerca de um século. Sente-se e desfrute. De preferência, com um pouco de pipoca.
O recém-descoberto pandoravírus pode aumentar esse debate. “Primeiro vistos como veneno, depois como formas de vida e então como produtos químicos biológicos, os vírus hoje estão em uma área cinzenta entre os seres vivos e não vivos”, escreve o biólogo molecular Luis Villarreal em artigo para a revista Scientific American. “Eles não podem se reproduzir por conta própria, mas podem fazê-lo em células verdadeiramente vivas e também podem afetar o comportamento de seus hospedeiros profundamente”. A ambiguidade decorre, em grande parte, de natureza paradoxal do vírus. Por um lado, eles possuem muitas características que nós associamos com a vida, como a presença de DNA e RNA e a capacidade de evoluir. Eles também são capazes de tomarem para si a estrutura celular de seus hospedeiros, que eles exploram para se reproduzir, se espalhar e infectar, às vezes, com eficiência letal.
É uma façanha impressionante e assustadora, especialmente para algo que não tem a capacidade de produzir suas próprias proteínas. Além disso, eles são seres bastante pequenos, fisicamente, pensavam os cientistas, e seus genomas são minúsculos. Eles não têm parede celular e nem sequer passam por processos metabólicos.
São razões como essas que fizeram a participação dos vírus ser negada na grande árvore da vida. Dez anos atrás, no entanto, a descoberta acidental do mimivírus forçou muitos cientistas a reconsiderar a qualificação do que é vida. Os pandoravírus, com seu tamanho desmedido e composição genômica sem precedentes, dão ainda mais razões para que os cientistas repensem essa classificação.
“Uma vez que mais de 93% dos genes dos pandoravírus não remetem a nenhum ser conhecido”, escrevem os pesquisadores na última edição da revista Science, “a sua origem não pode ser rastreada a qualquer linhagem celular conhecida”. No entanto, eles ponderam, o seu DNA polimerase se assemelha ao de outros vírus gigantes, sugerindo a existência de um controverso quarto domínio da vida”.
Ou seja, eles podem “inaugurar” um ramo até então desconhecido da vida, que é diferente dos aceitos três domínios: Eubacteria (que compreende as bactérias), Archaea (que inclui os procariontes que não se encaixam na classificação anterior), e Eukaria (que inclui todos os eucariontes, os seres vivos com um núcleo celular organizado como nós, os animais e as plantas). [Io9] http://hypescience.com/
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