segunda-feira, 15 de julho de 2013
Fauna gaúcha tem 11 espécies extintas e 274 ameaçadas
o Museu de Ciências Naturais da Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul (MCN/FZB).
A revisão da lista das espécies da fauna gaúcha em extinção, elabora em 2002, está sendo revisada e estará disponível para consulta pública a partir desta segunda (1-07-2013). 129 pesquisadores identificaram, onze anos depois, 274 espécies em extinção no Rio Grande do Sul, sendo 11 regionalmente extintas. De acordo com Glayson Bencke, foram avaliadas mais de 1580 espécies de mamíferos, repteis, anfíbios, e peixes de água doce do estado, além de um conjunto de espécies de invertebrados, como aranhas, moluscos.
Apesar de ser impossível comparar os dados apontados nas duas listas por conta dos critérios de estudo adotados em cada uma, Bencke adianta que já “é possível perceber o número de espécies dos campos do Rio Grande do Sul que entraram na lista atual em comparação com a elaborada em 2002”. Segundo ele, “as espécies campestres estão em extinção, porque os pampas e os campos de cima da serra sofreram uma redução significativa nos últimos oito e 15 anos, respectivamente, com a expansão da soja e da silvicultura, além de problemas oriundos de espécies exóticas”.
Na entrevista a seguir, concedida por telefone à IHU On-Line, ele informa que os grupos de espécies florestais, “especialmente das florestas de planícies das terras baixas do litoral norte, das florestas do alto Uruguai e do planalto, que são mais degradadas, despontam como as que sustentam espécies em situação mais crítica. Nós podemos citar o norte do estado, com o Parque Estadual do Turvo, e outras poucas áreas no entorno, onde existem a anta, a onça pintada, o porco-queixada, o viado-materi, e outras espécies praticamente restritas a essas poucas grandes manchas do norte”.
Bencke é graduado em Zoologia, pela Unisinos, e pós-graduado na mesma área, pela UNESP de Rio Claro, São Paulo. Especialista em aves, ele atua como pesquisador do Museu de Ciências Naturais da Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul.
Confira a entrevista.
Entrevista especial com Glayson Bencke. “Embora o aumento das espécies em extinção tenha sido baixo, as elas mudaram mais do que implica esse ligeiro acréscimo. Então, quer dizer que mais espécies saíram da lista, deixaram de ser consideradas ameaçadas e outras entraram em seu lugar”, aponta o pesquisador do Museu de Ciências Naturais da Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul (MCN/FZB).
IHU On-Line – Quantas espécies estão na lista da fauna ameaçada de extinção no Rio Grande do Sul?
Glayson Bencke – A lista atual foi elaborada em 2002 e está em vigor hoje, com 261 espécies. Essa lista está sendo revisada, e a principal etapa já está concluída, que diz respeito à avaliação do estado de conservação das espécies da fauna estadual, por um grupo de 129 especialistas de 40 instituições, os quais usaram critérios de avaliação internacionais. Eles concluíram que existem 274 espécies enquadradas como ameaçadas, mas 11 como regionalmente extintas. A próxima etapa é a consulta pública, onde esse resultado será apresentado à sociedade para colher informações que possam refinar os dados com alguma informação importante.
IHU On-Line – Quais os critérios utilizados para analisar as espécies em extinção? Pode nos falar do processo de identificação dessas espécies? Quais são as razões para tantas espécies estarem em extinção?
Glayson Bencke – Foram utilizados critérios internacionais que levam em conta os limites de populações de distribuição geográfica e taxas de declínio, ou seja, de redução da população. Se as espécies se enquadram nessas categorias, estão ameaçadas. Existem três categorias de ameaça: a vulnerável, que está ameaçada de extinção, mas numa situação menos nítida; depois tem o estágio intermediário; e o estágio mais crítico. As espécies são enquadradas nessas categorias com base em dados quantitativos associados a dados qualitativos, que refletem o tamanho da população delas, a área de ocupação que ocupam no estado, e a taxa de declínio. Esses dados são diretos, baseados na contagem e na observação dos animais, e indiretos, com base nas capturas, como acontece no caso dos peixes. Hoje também temos monitoramento por satélite dos ecossistemas do estado, tanto os florestais quanto os campestres, que nos dão uma boa ideia de como as populações de animais vivem em campos, banhados ou florestas. Foram avaliadas mais de 1580 espécies, representando mamíferos, répteis, anfíbios e peixes de água doce do estado, mais um conjunto de espécies de invertebrados, como aranhas, moluscos.
IHU On-Line – Na versão da lista elaborada em 2002, foram indicadas 261 espécies em extinção. O número aumentou para 274. Qual o significado dessa mudança num período de 10 anos?
Glayson Bencke – É difícil comparar diretamente as duas listas, porque o critério que se utilizou hoje é completamente diferente do anterior. Em 2002, não se tinha um avanço tão grande na construção de critérios de avaliação. O trabalho de 2002 foi feito com o melhor material que existia à época, mas hoje existem critérios mais precisos, que permitem uma acurácia maior e, portanto, temos um resultado mais confiável no sentido de ter menos incertezas acerca das espécies que estão ameaçadas.
A mudança do critério de avaliação explica, em grande parte, a mudança de alteração no número. Além disso, hoje temos mais especialistas e mais informações sobre a fauna gaúcha, o que nos permitiu avaliar muito mais espécies do que foi possível avaliar em 2002. A lista de 2002 foi elaborada com a participação de 42 especialistas, mais 120 colaboradores, enquanto a lista atual envolveu 129 especialistas e 146 colaboradores. Foi um processo representativo e participativo e isso torna difícil comparar os dados com o resultado anterior. Acreditamos que daqui para frente será possível analisar os dados com mais precisão.
De qualquer maneira, já é possível perceber o número de espécies dos campos do Rio Grande do Sul que entraram na lista atual em comparação com a elaborada em 2002. As espécies campestres estão em extinção, porque os pampas e os campos de cima da serra sofreram uma redução significativa nos últimos oito e 15 anos, respectivamente, com a expansão da soja e da silvicultura, além de problemas oriundos de espécies exóticas.
IHU On-Line – O avanço da silvicultura no Estado contribui para a extinção de algumas espécies?
Glayson Bencke – Contribuiu no sentido de eliminar o habitat das espécies que dependem do campo. A expansão ocorre nas regiões campestres, assim como a agricultura eliminou os ambientes florestais há décadas com a expansão do trigo. É um processo que se repete com as paisagens campestres, e isso preocupa porque se percebe o declínio de espécies por conta dos monocultivos. Também destaco a situação crítica de algumas espécies de peixes ao longo da costa do Rio Grande do Sul, que chegam a limites inaceitáveis, como as populações de peixes que foram levadas a zero por uma sobrepesca, chegando à beira de extinção, como os pequenos tubarões.
IHU On-Line – Como esse dado é comparado com outros estados do país?
Glayson Bencke – As avaliações por estado não são simultâneas. Então, não existe como comparar qual seria o número de espécies ameaçadas, hoje, em outros estados. Por exemplo, a lista do Rio de Janeiro está recém sendo atualizada, e a lista anterior, se não estou enganado, é de 1998 ou 1995. A lista de São Paulo foi atualizada em 2008, e a de Santa Catarina saiu no ano passado. Então, os estados estão em momentos diferentes, o que dificulta um pouco a comparação.
É importante frisar que temos a lista nacional, elaborada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, e as listas regionais, que são complementares. Uma espécie pode estar bem em outros estados, mas em extinção em outro. E se está desaparecendo num estado, no futuro pode vir a desaparecer em outros. A propósito, a lista nacional também está sendo revisada. As últimas listas são de 2003 e de 2004: a de 2003 envolvendo organismos terrestres, e a de 2004 envolvendo organismos marinhos, aquáticos.
Esse processo é longo, porque envolve muitos grupos, muitos especialistas, são realizadas oficinas para cada grupo. Então, realmente é um processo lento.
IHU On-Line – Em que regiões do estado a fauna está mais ameaçada?
Glayson Bencke – Para responder a essa questão, precisaria fazer um balanço pela distribuição das espécies. Sabemos que 22% das espécies de mamíferos no estado estão ameaçadas. Quer dizer, uma em cada quatro ou cinco espécies de mamíferos está ameaçada. As aves são 14%, aproximadamente uma em cada seis espécies. Répteis são 11%, uma em cada dez espécies ameaçadas. Anfíbios são 15%; esse é um grupo que subiu bastante em relação à lista anterior. Em 2002 contabilizamos uns dez anfíbios, e agora estamos com 16, houve um aumento de 60%. Houve um aumento da extinção de peixes também; passou de 28 espécies em extinção para 69.
Os grupos de espécies florestais, especialmente das florestas de planícies das terras baixas do litoral norte, das florestas do alto Uruguai e do planalto, que são mais degradadas, despontam como as que sustentam espécies em situação mais crítica. Nós podemos citar o norte do estado, com o Parque Estadual do Turvo, e outras poucas áreas no entorno, onde existem a anta, a onça pintada, o porco-queixada, e outras espécies praticamente restritas a essas poucas grandes manchas do norte. E aí, como eu frisava antes, embora se tenha menos diversidade e menos riqueza de espécies nos campos, proporcionalmente as espécies de campo estão bem representadas, infelizmente, na nova lista que está para ser chancelada e concluída.
Então, muitas espécies de peixes anuais, que são pequenos peixes que habitam poças temporárias no meio do campo, nas margens dos rios, abrigam várias espécies ameaçadas, mais de duas dezenas. Várias aves campestres também se enquadram como ameaçadas, pela perda do hábitat, algumas também por efeito de captura.
IHU On-Line – Houve alguma surpresa durante a realização da pesquisa?
Glayson Bencke – Embora o aumento das espécies em extinção tenha sido baixo, as espécies mudaram mais do que implica esse ligeiro acréscimo. Então, quer dizer que mais espécies saíram da lista, deixaram de ser consideradas ameaçadas e outras entraram em seu lugar. Para citar um exemplo, partimos de 28 espécies de peixes para 69 espécies ameaçadas na nova avaliação. Então, aí já se vê que entraram muitas espécies que antes não eram consideradas ameaçadas. Em contrapartida, o número de aves, possivelmente por causa do critério mais preciso que permite avaliar com mais acurácia aquela espécie que está no limite entre ameaçada ou não, o número de espécies de aves reduziu de 118 para 91. E isso, infelizmente, não representa, pelo menos nesse momento, uma melhora nas condições do ambiente, o que poderia se esperar a partir desses números, mas, sim, o uso de um critério mais preciso de que a tendência é se manter a longo prazo o uso desse mesmo critério, e aí vai tornar mais comparável.
IHU On-Line – Deseja acrescentar algo?
Glayson Bencke – Só gostaria de acrescentar que esse trabalho foi conduzido pela Secretaria Estadual do Meio Ambiente, coordenado pela Fundação Zoobotânica, mas a avaliação das espécies foi feita, na verdade, por um grande conjunto de especialistas que trabalharam voluntariamente na avaliação do estado de conservação da espécie. Colocaram, então, seu conhecimento, expertise à disposição do Rio Grande do Sul para avaliar o estado de conservação das espécies.
O sistema foi operado via internet, desenvolvido conjuntamente pela Fundação Zoobotânica e pela Companhia de Processamento de Dados do Estado do Rio Grande do Sul – Procergs, e o sistema livre foi operado pela internet, permitindo com que mais pessoas fossem integradas ao processo e trabalhassem remotamente, dos seus escritórios, das suas salas de trabalho, das suas casas. Então, teve-se um alcanço maior a esses especialistas, com um custo muito mais baixo, e com melhora na documentação. Hoje temos todas as informações mantidas com base de dados na internet, de fácil acesso e com segurança, graças a esse investimento e essa inovação tecnológica.
IHU On-Line/EcoAgência
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