sábado, 2 de fevereiro de 2013
Cientistas investigam impacto de plástico ‘oculto’ nos mares
Uma equipe da BBC que fazia um documentário no ano passado sobre vida marinha encontrou lixo plástico que viajou milhares de quilômetros pelo oceano até parar no outro lado do planeta, em uma ilha remota a noroeste do Havaí.
O grupo de documentaristas e biólogos encontrou tartarugas que faziam ninhos no meio de garrafas plásticas, isqueiros e brinquedos. E descobriu filhotes de albatrozes mortos ou à beira da morte porque seus pais os haviam alimentado com plástico.
Alguns dos filhotes morrem quando objetos pontiagudos perfuram seus corpos, outros por fome, com seus estômagos cheios de plástico que não conseguem digerir. Sabemos há algum tempo que o plástico é uma ameaça aos albatrozes, mas quão perigoso é o lixo plástico para outras espécies – inclusive o homem?
Parte do plástico encontrado nos nossos oceanos foi jogada no mar ilegalmente. Uma outra porção é lixo da pesca, mas a maioria vem da terra, de lixões mal administrados e de lixo industrial.
O lixo que flutua nos mares é carregado por grandes sistemas de correntes marítimas rotativas, como grandes redemoinhos, impulsionados pelo movimento de rotação da Terra e os ventos.
O arquipélago do Havaí está situado no meio de um desses sistemas, conhecido como o Giro do Pacífico Norte – um entre cinco sistemas interconectados de correntes oceânicas. Cada um desses sistemas forma uma espiral, girando em torno de um ponto central, levando detritos para o seu interior.
Essas espirais também podem expelir materiais em direção aos continentes Ártico e Antártico, espalhando o plástico por todo o planeta. O plástico é feito para durar, por isso, se degrada muito lentamente nos mares, despedaçando-se em fragmentos cada vez menores. Esses pedaços minúsculos de plástico são conhecidos como microplástico.
Mudanças hormonais – Para demonstrar o que acontece com o plástico que se degrada no oceano, o especialista em poluição marinha Simon Boxall, do Centro Nacional de Oceanografia britânico em Southampton, na costa sul da Grã-Bretanha, filtrou 400 toneladas de água do mar e levou os detritos para análise em seu laboratório.
A olho nu, era possível ver lama, galhos e penas. Mas observada ao microscópio, a amostra continha pequenas partículas de plástico.
Havia pedaços de cordas plásticas, sacolas e fragmentos coloridos, alguns com forma pontiaguda. Algumas das partículas tinham menos de um milímetro de espessura, o mesmo tamanho de organismos vivos presentes na amostra – fitoplâncton (organismos vegetais) e zooplâncton (organismos animais).
“Tem havido muita pesquisa nos Estados Unidos para investigar como o plástico entra na cadeia alimentar”, diz Boxall. “Certamente foi demonstrado que ele entra nos bivalves, moluscos e ostras no fundo do mar, e exerce um efeito sobre eles.”
“Eles acumulam biologicamente o plástico na medida em que filtram a água. Isso concentra o plástico e efetivamente transforma alguns dos moluscos em hermafroditas”, afirma. “Há alguns anos, achávamos que aquilo era só fibra, e que não havia grande impacto, mas sabemos agora que essas partículas muito pequenas podem imitar coisas como o estrogênio.”
O pesquisador acrescenta, no entanto, que o efeito verdadeiro ainda não é conhecido. “Essas partículas plásticas são como esponjas, são ímãs que atraem contaminação, coisas como o tributilestanho (substância extremamente tóxica, usada em pinturas de barcos). As minúsculas partículas absorvem esses materiais e efetivamente se tornam muito tóxicas”, descreve Boxall.
“Não sabemos ainda se isso depois tem impacto sobre a cadeia alimentar. Ainda é cedo para saber quão longe na cadeia alimentar essas partículas plásticas penetram.”
Efeito desconhecido – Especialistas do centro de Ecologia e Biologia Marinha da Universidade de Plymouth, na Grã-Bretanha, estudam o impacto de poluentes sobre oceanos e rios e sobre as criaturas que os habitam. O cientista Richard Thompson, que trabalha no centro, foi o primeiro a descrever os minúsculos fragmentos de plástico como ‘microplásticos’, já em 2004.
“Há duas preocupações do ponto de vista toxicológico”, diz Thompson. “Há o fato de que plásticos são conhecidos por absorver e concentrar substâncias químicas da água do mar.”
“E a segunda questão diz respeito a substâncias químicas que foram introduzidas nos plásticos desde o momento da fabricação para a obtenção de qualidades específicas, como flexibilidade, ou substâncias retardadoras de chama e antimicrobianas.”
Com o plástico disperso na natureza em pequenos fragmentos, resta saber se existe a possibilidade de que essas substâncias químicas também sejam liberadas no meio ambiente. E a resposta, segundo Thompson, é que são necessárias mais pesquisas sobre o assunto.
A equipe do especialista examinou peixes encontrados no Canal da Mancha, cerca de 500 indivíduos de dez espécies diferentes, entre eles, a cavala e o poor cod (peixe da família do bacalhau). Os resultados do estudo foram publicados no Marine Pollution Bulletin (Lusher et al, MPB, December 2012).
“Encontramos plástico microscópico nas vísceras de todas as espécies, mas em quantidades relativamente baixas – uma ou duas partículas por peixe – então certamente não há um risco do ponto de vista da população humana que consome esses peixes porque normalmente não comemos as vísceras”, afirma Thompson.
Mas se o plástico em si não é consumido por humanos, haveria perigo de contaminação da carne do peixe pelas substâncias tóxicas contidas no plástico, e por consequência, do homem que come o peixe?
Thompson diz que ainda não é possível saber. “As quantidades de plástico que estamos encontrando são tão pequenas que qualquer risco do ponto de vista do consumo humano é inexistente, ao menos pelo que sabemos no momento”, diz o pesquisador. “Obviamente, isso é algo que precisamos pesquisar mais.”
O especialista acrescenta, no entanto, que a equipe quer saber se o plástico representa um perigo para os animais que o ingerem, tanto por sua presença em seus organismos como pela possibilidade de que ele transporte consigo substâncias químicas nocivas.
Portanto, se por um lado o impacto do alastramento do lixo plástico pelos mares pode ser avaliado por especialistas que estudam a vida marinha em lugares remotos como o Havaí, o efeito do plástico ‘oculto’ espalhado pelos oceanos é mais difícil de avaliar. (Fonte: G1)
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